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Procuradoria Especial da Mulher da ALE-RR atua para combater violência psicológica, um mal silencioso

G1 - com informações do G1

Rastro101
Com informações do G1

11/10/2023 por Redação

Dados de atendimentos do Centro Humanitário de Apoio à Mulher (Chame) revelam que casos de violência psicológica lideram registros.
Jader Souza
Ela é silenciosa, difícil de ser entendida pelas vítimas e tem crescido ano após ano. A violência psicológica contra as mulheres é considerada porta de entrada para outros tipos de abusos, como a agressão física, considerada crime no Brasil a partir da Lei Maria da Penha. Frente a esse cenário, a Assembleia Legislativa de Roraima (ALE-RR) tem intensificado sua rede de proteção às vítimas, por meio da Procuradoria Especial da Mulher.
Neuropsicóloga Mayla Garcia explica o trabalho de apoio psicológico do Chame
Marley Lima
“A violência psicológica é considerada silenciosa, porque, muitas vezes, a mulher não percebe que está passando por isso. Às vezes, ela já viu isso acontecer em casa e projeta nos relacionamentos, e só percebe pelo âmbito externo que o companheiro faz não é certo. Ele não pode humilhar, desmotivar, xingar, porque tudo isso adentra a violência psicológica”, avalia a neuropsicóloga Mayla Garcia, que atende no núcleo.
Dados dos 14 anos de atendimento do Chame revelam a violência psicológica no topo do ranking.
Gráfico: Abraão Borges
De janeiro a setembro de 2023, foram registrados pelo Centro Humanitário de Apoio à Mulher (Chame), programa da Procuradoria Especial da Mulher, 41 casos de violência psicológica, a de maior registro. Os gráficos mostram que, nos últimos meses, essa violência tem sido constante nos atendimentos. Situações da rotina do casal, como o marido exigir a troca de roupa que a mulher está vestindo, se encaixam nesse tipo de abuso.
“O agressor tem uma característica peculiar: ele é manipulador”, destaca a neuropsicóloga Marcilene Melo.
Marley Lima
“Ele pode realmente cometer uma violência psicológica contra a mulher quando fala que não quer que ela se vista dessa maneira, porque vai chamar atenção. E, dependendo do que acontecer no ambiente externo, vai atribuir essa culpa à vítima por não obedecer quando pediu para tirar essa roupa”, explica a também neuropsicóloga do núcleo Marcilene Melo.
Identificando os casos
A culpabilização das vítimas é observada com frequência nos casos que chegam até o setor, reforça Mayla. O tratamento psicológico negativo dado pelo agressor pode gerar outras violências, como a física, e desencadear casos ainda mais graves, como o feminicídio. Em Roraima, considerado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública como um dos estados mais violentos contra as mulheres, esse cenário precisa ser constantemente combatido.
“O violentômetro faz uma medição do início até o feminicídio. Com isso, percebemos que se inicia com a violência psicológica, porque o agressor vai dando sinais nesse período, como a questão da roupa, e a mulher vai perdendo a sua própria identidade, a sua autoestima. E, a partir disso, o agressor entende que ele pode conseguir o que quiser no relacionamento. É justamente isso que estamos combatendo”, destacou.
Mais de 40 casos de violência psicológica foram registrados pelo Chame em 2023.
Marley Lima
É possível, então, identificar os primeiros sinais de uma violência psicológica? A psicóloga Marcilene pondera que a mulher precisa estar atenta ao tratamento do homem para com ela, pois pode haver uma mudança de comportamento. Ela acrescenta que até mesmo o tom de voz deve ser observado com o passar do tempo na relação a dois.
“Quando o relacionamento se inicia, não vai haver um grito, uma voz alta. Tudo é lindo e romântico. Por exemplo, podemos ser gentis anos e anos de casamento. ‘Podes trazer um copo d’água, por gentileza?’. Isso precisa perdurar. Quando isso muda, quando o homem já não pede, mas impõe a mulher, como se fosse obrigação dela servi-lo, podem ser observados os primeiros sinais. Quando ele diz que ela já não é mais bonita, usa da humilhação, palavras de baixo calão, a mulher precisa observar esse comportamento”, detalha a profissional.
Outro exemplo trazido por Mayla é a imposição de sonhos. Ou seja, a mulher passa a viver os sonhos do companheiro, por imposição dele. A psicóloga lembra que já presenciou uma vítima se questionar sobre quem era, após ter sofrido constante violência psicológica, e conseguir sair do relacionamento.
“Ele diz: ‘Tenho este plano e, automaticamente, você tem esse plano’. Ele quer criar uma empresa, e não leva em consideração, não importa para ele, a profissão que você deseja, ele impõe que você vai trabalhar com ele. E, muitas vezes, a mulher pensa que realmente ela quer aquilo. No final, ela não está feliz, o homem continua mantendo seu jogo autoritário, e o respeito já foi embora”, complementa.
Acompanhamento multiprofissional é importante para auxílio às vítimas de violência doméstica e familiar, destacam as psicólogas do Chame
Marley Lima
Ambas as psicólogas concordam que o acompanhamento com o profissional da psicologia é a ferramenta mais importante para ajudar as vítimas. “Ela saiu do relacionamento. Mas e as lembranças? As noites que ela não dormiu? Pode não ter tido violência física, mas a vítima pode ter pensado em suicídio durante o relacionamento. A psicologia é a ferramenta principal para a nova perspectiva de vida”, diz Mayla. “Nosso trabalho é fazer com que ela olhe para dentro de si e veja que é capaz e se ame mais”, acrescenta Marcilene.
O Chame dispõe de seis psicólogos, que atendem das 8h às 18h durante a semana, na sede da Procuradoria Especial da Mulher, localizada na Avenida Santos Dumont, nº 1470, bairro Aparecida. Quando necessário, a vítima recebe mais sessões de terapia, para fortalecê-la nessa etapa de sofrimento. Já o ZapChame, que atende virtualmente pelo número (95) 98402-0502, funciona 24h por dia, todos os dias da semana. Além disso, a vítima recebe da rede de acolhimento o apoio jurídico e o de assistência social.
Ampliando a rede de enfrentamento
Palestras em escolas reforçam trabalho da rede de enfrentamento à violência contra a mulher.
Marley Lima
Desde o início do ano, a Procuradoria Especial da Mulher tem levado para as escolas estaduais de Boa Vista e do interior de Roraima, palestras sobre os tipos de violência, como enfrentá-las e os canais de denúncia. Nas unidades de ensino, quando o tema se volta para a violência psicológica, alguns estudantes que já têm relacionamento se identificam com as explicações expostas.
“Levamos para as escolas essas palestras, para os adolescentes, porque lá está a base social deles, muitos estão iniciando seus relacionamentos. E não poderia ser em período específico, fazer uma campanha e sair das unidades. Não. Estamos e vamos manter esse trabalho continuamente, falando sobre a violência e massificando a informação”, fala a diretora da Procuradoria Especial da Mulher, Glauci Gembro.
Já foram quase 80 escolas e mais de 2,2 mil alunos contemplados. Quando há recesso escolar, as equipes multidisciplinares vão para espaços públicos onde a presença feminina é constante, como o Centro de Referência da Saúde da Mulher e unidades de saúde.
“Esse trabalho nas escolas é importantíssimo, porque os alunos já vão entender os ciclos de violência, como acontecem, e vão saber se defender. Outra razão para estarmos nesses espaços é que alguns alunos têm um pai agressor e não se dão conta de que a mãe está sendo agredida. Então, sempre falamos: salvem o número do ZapChame em um lugar de fácil localização para acionar quando precisar”, lembra Gembro.
Glauci Gembro explica que ZapChame já foi acionado por aluno que participou de palestra
Marley Lima
Os resultados já começam a ser vistos. Um estudante entrou em contato com o ZapChame, durante a madrugada, para denunciar que a mãe estava sendo agredida pelo marido. O Chame foi até a casa da família para dar apoio.
“Temos observado que essa ferramenta virtual tem recebido três vezes mais chamadas do que tinha anteriormente às palestras. E justamente para tirar dúvidas jurídicas, para pedir ajuda. Nossas equipes multidisciplinares ficam 24 horas disponíveis e, caso essa pessoa necessite de atendimento presencial, nós a trazemos até a sede da procuradoria e damos o suporte de que ela precisa”, concluiu.

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