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Com direito a 3ª dose, pessoas com HIV relatam preconceito em BH

Relatos apontam receio de revelar o diagnóstico à família ao tomar o reforço contra a Covid

Rastro101
Com informações do site O Tempo

30/09/2021 por Redação

Divulgação/O TempoDivulgação/O TempoQuem convive com HIV, o vírus da Aids, tem direito a receber a terceira dose da vacina contra Covid-19 em todo o Brasil. Em Belo Horizonte, a aplicação será iniciada em outubro, e cada cidade tem um calendário próprio.

Ainda nas primeiras doses, porém, algumas pessoas que convivem com o vírus relatam ter sofrido preconceito em postos de saúde da capital e, por receio de revelar o diagnóstico à família, algumas até deixaram de se vacinar na data correta.

Nesse cenário, especialistas e membros de movimentos sociais avaliam que a terceira dose também pode ser menos procurada. 
“As pessoas se perguntaram como falariam para a família que tomariam a vacina para quem tem comorbidade, porque seriam questionadas sobre o que têm. Isso acontece no trabalho também. Ouvimos o relato de uma mulher de 43 anos que precisou falar no emprego que tomaria a vacina e inventou que no posto do bairro dela haviam adiantado a vacinação por faixa etária. Evoluímos muito em relação à doença, mas as pessoas ainda não têm essa dimensão, por isso o estigma existe. Acho que ainda vai haver redução da procura para a terceira dose”, relata o fundador da ONG Florir, que acolhe pessoas com HIV em BH e região, Rodrigo Silveira. 

L, 29, poderia ter se vacinado em maio, no grupo de pessoas com comorbidades, mas esperou até agosto, quando a vacinação chegou à sua faixa etária, para não revelar o diagnóstico em casa.

“Minha família é muito religiosa e preconceituosa, e pessoas do posto perto de casa conhecem meus parentes. Nesse intervalo, fiquei pensando que poderia ter me vacinado, porque eu estou trabalhando de casa, mas outros familiares, não, e poderiam acabar adoecendo e passando Covid-19 para mim. Sempre fui a pessoa que insistiu para que todos usassem máscara e se protegessem”, conta. 

O secretário executivo da Rede Estadual de Adolescente e Jovens Vivendo com HIV/Aids de Minas Gerais, Rafael Sann, diz que, em empresas, por exemplo, algumas pessoas optam por apresentar apenas o comprovante da segunda dose, planejando não comentar sobre a terceira. “O importante é tomar a vacina”, destaca. 

“O paciente que tem carga viral indetectável leva uma vida normal”, pontua o médico e professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Jorge Andrade Pinto, lembrando que pessoas que estão com HIV controlado tendem a ter boa resposta imune. Ainda assim, ele recomenda que quem tem o direito à terceira dose não a dispense. 

Exposição do diagnóstico

Além do transtorno com as famílias e conhecidos, o fundador da ONG Florir, Rodrigo Silveira, aponta que há despreparo de alguns profissionais nos postos de saúde da capital. Todo paciente tem direito ao sigilo sobre o diagnóstico, o que não foi respeitado em algumas filas de vacinação, segundo ele. “Eu estava em uma fila gigante e, quando entreguei a documentação, a profissional falou em alto e bom tom ‘Ah, vai tomar porque tem Aids, né’. Já começou um burburinho na fila”, diz.

A reportagem ouviu mais relatos sobre situações similares e, questionada, a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) informou que todas as equipes são orientadas a manterem o sigilo das condições clínicas do usuário e que elas serão novamente orientadas.

Para receber a terceira dose da vacina em BH, de acordo com a prefeitura, é necessário apresentar exames, receitas, relatórios ou prescrições médicas de até 12 meses e outros comprovantes com descritivo ou CID da doença ou condição de saúde.

O secretário executivo da Rede Estadual de Adolescente e Jovens Vivendo com HIV/Aids de Minas Gerais destaca que, até sem a necessidade de inserir o nome da condição, o constrangimento foi relatado com frequência. “Mesmo assim, os profissionais perguntavam qual era a comorbidade. Teve gente que saiu da fila por causa disso”, conta. 

Queda de casos de HIV

A confirmação de casos de HIV em Belo Horizonte diminuiu com a pandemia: em 2019, foram 828 casos, contra 563 em 2020, queda de 32%. Em 2021, até julho foram 243 novos casos, segundo a Secretaria Municipal de Saúde. A PBH estima que 10 mil pessoas convivam com HIV na cidade, atualmente. 

A queda de diagnósticos não quer dizer necessariamente que menos pessoas tenham se contaminado, já que também houve flutuações na demanda por atendimentos, explica a coordenadora de Saúde Sexual e Atenção às IST, AIDS e Hepatites Virais do governo municipal, Cristiane Hernandes.

“De forma qualitativa, vimos que houve receio das pessoas em procurar os centros de saúde e flutuação da procura por recursos de prevenção ao longo dos últimos 18 meses. Em 2021, houve tendência à normalização”, diz. 

O médico e professor da UFMG Jorge Andrade Pinto analisa que a eventual diminuição de confirmações pode não ser permanente, além de depender do restante de dados do restante de 2021. “Houve diminuição de circulação de pessoas, mas é um aspecto transitório”, lembra. 

A distribuição de preservativos nos serviços de saúde pública da capital diminuiu cerca de 50% entre janeiro e agosto de 2019 e o mesmo período de 2021, ano sem Carnaval. Já a quantidade de testes rápidos de HIV continua em uma crescente: neste ano, foram 22.267, enquanto em 2019 foram 13.971, no mesmo período, crescimento de quase 60%. O aumento é parte de um esforço de disponibilizar a testagem nos serviços de atenção primária de saúde, segundo Hernandes. 

O atendimento a novos pacientes que procuram a Profilaxia Pré-Exposição (PrEP), método de prevenção ao HIV, continua suspenso na cidade. Antes da pandemia, ele ocorria nos Hospitais Eduardo de Menezes e no Centro de Referência Orestes Diniz. Segundo Hernandes, a volta do acolhimento de novos usuários depende de negociações com o governo estadual e ela diz esperar normalização nos próximos dois meses. 

Nova dose

Pessoas com HIV podem tomar a terceira dose 28 dias após a segunda. A vacinação começará pelas pessoas de 50 a 69 anos, no dia 9 de outubro.

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