Ministros julgaram tema em plenário virtual e concluíram que uso dos símbolos é válido para manifestar os valores culturais da sociedade. Decisão vai nortear instâncias inferiores. Reunião do presidente Lula no Palácio do Planalto com cruz de Cristo ao fundo
Ricardo Stuckert/Presidência da República
Por unanimidade, os ministros do Supremo Tribunal Federal consideraram válida a presença de símbolos religiosos em prédios do governo, desde que o objetivo seja manifestar a tradição cultural da sociedade.
O tribunal concluiu a análise, em ambiente virtual, do recurso que questiona a exposição destes objetos em órgãos públicos, em unidades de atendimento aos cidadãos em geral.
O processo começou a ser julgado no dia 15 e a sessão virtual terminou nesta terça-feira (26).
A discussão envolveu direitos previstos na Constituição. Entre eles, a liberdade religiosa e o Estado laico – a posição de neutralidade do Poder Público diante das diferentes concepções religiosas.
Voto do relator
Prevaleceu o voto do relator atual do caso, o ministro Cristiano Zanin. O ministro votou no sentido de que a presença dos símbolos religiosos não afeta princípios constitucionais.
Zanin sugeriu a seguinte tese:
“A presença de símbolos religiosos em prédios públicos, pertencentes a qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, desde que tenha o objetivo de manifestar a tradição cultural da sociedade brasileira, não viola os princípios da não discriminação, da laicidade estatal e da impessoalidade“.
A proposta foi acolhida pelos ministros e será uma espécie de guia a ser aplicado em processos semelhantes em instâncias inferiores da Justiça.
Acompanharam a posição do relator os ministros Flávio Dino, André Mendonça, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes, Luiz Fux, Nunes Marques, Luís Roberto Barroso e a ministra Cármen Lúcia.
Veja mais detalhes no vídeo abaixo – gravado quando o julgamento ainda estava em andamento, mas já havia maioria para validar a tese:
STF tem maioria para validar uso de símbolos religiosos em órgãos públicos
O ministro Edson Fachin acompanhou Zanin com ressalvas, pontuando o reconhecimento de culturas diversas e formas diferentes do modo de ser e de estar.
Por me alinhar a percepção que no caso dos autos a presença do crucifixo em espaços públicos se coloca como uma manifestação cultural, não verifico violação a liberdade de crença e consciência e a laicidade estatal. Ressaltadas as celebrações e o reconhecimento de culturas diversas e formas diferentes do modo de ser e de estar, acompanho o e. Relator no desprovimento do Recurso e fixação de tese, afirmou o ministro.
Ao votar, a ministra Cármen Lúcia afirmou que a proposta de tese do relator não dá espaço para proselitismo religioso em órgãos públicos. Afirmou ainda que o atendimento dos agentes públicos deve ser fiscalizado.
Essa tese não dá espaço para proselitismo religioso em órgãos públicos, não sendo o que se está a decidir este Supremo Tribunal. O atendimento dos agentes públicos municipais, estaduais e federais a essa tese de repercussão geral deverá ser fiscalizado pelos órgãos de controle e fiscalização, que deverão adotar as providências cabíveis se forem identificadas práticas que extrapolem os limites estabelecidos por este Supremo Tribunal, escreveu Cármen.
Recurso
A disputa jurídica começou com uma ação do Ministério Público Federal contra a exposição de símbolos religiosos (crucifixos, imagens) em prédios do governo federal destinados ao atendimento do público no estado de São Paulo.
Inicialmente, a Justiça Federal rejeitou o pedido. Sustentou que a laicidade do Estado não impede a convivência com o símbolos religiosos, mesmo que em locais públicos, porque eles refletem a história nacional ou regional.
O Tribunal Regional Federal da 3a Região, a segunda instância, também negou o pedido, sob o argumento de que a presença dos objetos não fere a previsão de Estado Laico.
O Ministério Público, então, acionou ao Supremo. Em 2020, a Corte reconheceu a repercussão geral do tema.