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Justiça militar revoga prisão de PM que atirou e matou idoso na Zona Leste de SP

G1 - com informações do G1

Rastro101
Com informações do G1

03/06/2024 por Redação

Tribunal aceitou pedido de habeas corpus feito pela defesa após o caso ter sido encaminhado à Justiça comum. Clóvis Marcondes de Souza morreu após ser baleado por tiro acidental de PM em SP
TV Globo/Arquivo Pessoal
O Tribunal de Justiça Militar do estado de São Paulo concedeu nesta segunda-feira (3) um habeas corpus ao sargento Marcio de Oliveira, que estava preso preventivamente por efetuar o disparo que resultou na morte de um aposentado no Tatuapé, Zona Leste da capital paulista.
TJM aceitou o pedido de habeas corpus feito pela defesa do PM por entender que não tem mais competência sobre o caso, que foi encaminhado à Justiça comum em 28 de maio (leia mais abaixo).
João Carlos Campanini, advogado do sargento, confirmou a informação ao g1. Segundo Campanini, o inquérito policial militar, incluindo a decisão da Justiça Militar em soltá-lo, ainda será avaliado pela Justiça comum.
Clóvis Marcondes de Souza, de 70 anos, estava a caminho da farmácia em 7 de maio quando foi baleado por um PM durante uma abordagem a dois homens numa moto. Ele não tinha nenhuma relação com os suspeitos.
O tiro foi disparado do interior da viatura dos policiais. Uma câmera de segurança gravou o momento que o idoso é baleado na cabeça e cai na calçada na Rua Platina, no Tatuapé (veja vídeo abaixo).
Idoso é morto por tiro de PM na Zona Leste de SP
A Justiça Militar acatou o pedido do Ministério Público e se declarou incompetente para analisar o caso. Com isso, o julgamento passou a ser responsabilidade da Justiça comum.
O g1 solicitou posicionamentos ao Ministério Público e ao Tribunal de Justiça de SP a respeito do caso e aguarda respostas.
Procedimento incomum
Em 20 de maio, a Associação dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo (ADPESP) havia pedido a instauração de um inquérito para apurar a conduta dos oficiais da PM por terem conduzido as investigações iniciais do homicídio no próprio quartel e não terem registrado o caso na delegacia.
Fugindo do procedimento padrão, o boletim de ocorrência sobre o assassinato do idoso não foi registrado pelos PMs envolvidos na ocorrência na Polícia Civil. O caso foi encaminhado diretamente para a Polícia Judiciária Militar.
O pedido também solicitava a investigação pelos eventuais crimes de falsidade ideológica e prevaricação. Segundo André Pereira, presidente da ADPESP, o procedimento adotado pelos policiais foi realizado em desacordo com a lei.
“Os familiares da vítima certamente ficaram sem entender o porquê de não estarem em uma delegacia, sendo atendidos por um Delegado de Polícia. O erro fica claro, inclusive, pelo fato desse procedimento lavrado no quartel ter sido considerado irregular, por falta de homologação do auto de prisão em flagrante pela comandante do batalhão, conforme representação do Ministério Público e acatada pelo Juiz Militar, o que resultou no relaxamento da prisão em flagrante”, afirma o presidente.
A decisão da PM de querer investigar o caso da morte de Clóvis sozinha, sem ao menos levá-lo ao conhecimento da Polícia Civil ou registrar um boletim de ocorrência do que aconteceu numa delegacia, acentuou ainda mais a crise entre as duas polícias do estado de São Paulo.
Por causa da repercussão do caso, o Ministério Público pediu para a Polícia Civil também investigar a morte do idoso, o que teve início em 11 de maio, após a própria família da vítima registrar o boletim de ocorrência.
Justiça comum
Em 28 de maio, o juiz Ronaldo João Roth considerou que houve dolo eventual na ação do sargento Roberto Marcio de Oliveira, de 49 anos, que fez o disparo que resultou na morte do aposentado.
Justiça militar passa à Justiça comum caso de idoso morto por PM em SP
Roth também citou que houve falhas de procedimentos operacionais e mencionou o “método Giraldi”, que foi criado justamente para diminuir a letalidade, que orienta: “nunca manuseie arma ou munição no interior da viatura”.
O juiz concluiu: “Fica evidente, assim, que a arma somente disparou pelo fato de o investigado ter acionado o gatilho de sua arma, precipita e desastradamente, colocando em risco terceiras pessoas inocentes, diante da abordagem policial, o que tirou a vida da vítima”.
Segundo o presidente da Associação dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo (ADPESP), André Pereira, a ação da Polícia Militar serviu somente para atrasar o julgamento a partir de agora e que toda essa situação poderia ter sido evitada.
A Secretaria da Segurança Pública (SSP) informou que não comenta decisões judiciais.
Uma resolução da própria pasta (SSP-40), publicada em março de 2015, define que casos de morte decorrentes de intervenção policial na capital devem ser obrigatoriamente registrados e investigados pelo Departamento de Homicídio e de Proteção à Pessoa (DHPP).
O presidente da associação também aponta que os PMs descumpriram a Lei Orgânica Nacional das Polícias Civis (n° 14.735/2023), que estabelece que as polícias civis são instituições permanentes, com funções exclusivas e típicas de Estado, essenciais à justiça criminal e imprescindíveis à segurança pública e à garantia dos direitos fundamentais no âmbito da investigação criminal.
“Um dos nossos objetivos agora, além de apurar os possíveis crimes militares, é saber o seguinte: de onde partiu a ordem para levarem a ocorrência para o quartel, pois a própria comandante do batalhão não homologou a prisão em flagrante do autor do disparo. De onde veio a ordem?”, enfatiza Pereira.
Em nota, a SSP informou que todas as circunstâncias relativas ao caso são investigadas pela Justiça Militar e pelo inquérito instaurado pelo DHPP, com acompanhamento do Ministério Público.
Anteriormente, a investigação estava sendo feita somente pela Polícia Militar (PM) sob a alegação da corporação de que o disparo foi acidental. E que, segundo o Código Penal Militar, pelo fato de ser um homicídio culposo (sem intenção de matar) cometido por um policial militar, ele poderia ser apurado exclusivamente pela Polícia Judiciária Militar.
A Secretaria da Segurança Pública (SSP) chegou a informar à imprensa que somente homicídios dolosos cometidos por policiais militares são de competência da Justiça comum, sendo investigados pela Polícia Civil.
Morte de idoso por policial militar é registrada como homicídio culposo
DHPP pede body cam dos PMs
Clóvis e a família em jogo do Palmeiras
Arquivo pessoal
O Departamento de Homicídios analisou preliminarmente a câmera de segurança que gravou o momento que a viatura da Polícia Militar encosta do lado de dois homens numa moto e os obriga a pararem. Em seguida o sargento Roberto, que estava no banco traseiro, atira e atinge a cabeça de Clóvis, que passeava pela calçada, e cai no chão.
A vítima sequer conhecia os suspeitos, que também não foram detidos pelos policiais militares pois não estavam cometendo nenhum crime. Uma ambulância foi chamada para o local, mas chegando lá constatou que o idoso já havia morrido. Clóvis estava a caminho da farmácia quando foi baleado.
Família de idoso morto por um policial militar fala sobre o crime
A descrição da ocorrência como homicídio decorrente de oposição à intervenção policial foi afastada por falta de amparo técnico e legal, pois, ao menos na fase preliminar da investigação, não há que se falar em homicídio decorrente de oposição, pois analisando os fatos e as informações obtidas, não houve qualquer oposição, especialmente em relação à vítima fatal (um civil), que apenas passeava pelo local dos fatos e, inicialmente, não tinha qualquer relação com a ocorrência policial que antecedeu sua morte, informa o registro do boletim de ocorrência feito pelo DHPP.
Diante do exposto, em fase urgente de cognição sumaríssima, com base nas informações coletadas e nas diligências realizadas, o caso foi registrado preliminarmente como homicídio doloso (art. 121, CP), tendo como investigado o policial militar Roberto Rárcio de Oliveira (1º Sargento PM), mas sem prejuízo de posterior reenquadramento legal em caso de novas informações ou de entendimento jurídico diverso no decorrer do inquérito policial, consta na ocorrência da Polícia Civil.
O DHPP também pediu à Polícia Militar as imagens gravadas pelas body cams dos quatro PMs que estavam na viatura no momento do disparo que matou Clóvis.
Diante dos fatos, das informações coletadas, do cenário conturbado, da necessidade de aguardar os laudos referentes aos exames requisitados (IC e IML [respectivamente Instituto de Criminalística e Instituto Médico Legal]), da necessidade de realização de oitivas e da necessidade de análise de imagens de câmeras corporais dos policiais militares envolvidos na ocorrência e de câmeras de segurança do local dos fatos, informa o Departamento de Homicídios.
Ferroviário e palmeirense
Clóvis e família palmeirense
Arquivo pessoal
Clóvis trabalhou no patrimônio da Ferrovia Paulista S/A (Fepasa) por 34 anos. Ele ficava na Estação Júlio Prestes. E ainda trabalhou na Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) por 15 anos. Após 49 anos trabalhando, ele aposentou em dezembro de 2019.
Palmeirense fanático, ele não perdia um jogo. Casado há 45 anos, ajudava a esposa a lavar louça e passar roupa. Gostava muito de ir à feira e de caminhar. Faria 71 anos no próximo dia 27 de maio. Deixou a esposa, dois filhos e dois netos.
Paulo Proença, genro de Clóvis, falou à reportagem que é preciso apurar se, de fato, o disparo foi acidental e se a morte foi sem intenção. A gente não pode tratar como um acidente como um crime culposo. Se a pessoa sacou uma arma, ela assume o risco, disse.

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