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Nova espécie de tardígrado é descoberto em musgo de árvores do Instituto de Biologia da Unicamp

G1 - com informações do G1

Rastro101
Com informações do G1

04/04/2024 por Redação

Invertebrado transparente possui garras que variam de tamanho, de uma pata para outra. Com cerca de 80 espécies conhecidas, grupo de animais é pouco estudado no Brasil. Nova espécie de tardígrado encontrado em árvores do Instituto de Biologia da Unicamp
Laboratório de Microscopia Eletrônica do IB
Uma nova espécie de tardígrado foi descrita por por pesquisadores do Instituto de Biologia (IB) da Unicamp, em Campinas (SP). A descoberta do invertebrado transparente, batizado de Milnesium iniquum, foi publicada no periódico alemão Zoologischer Anzeiger em fevereiro.
Segundo Emiliana Guidetti, mestranda do Programa de Pós-Graduação em Biologia Animal da Unicamp e primeira autora do artigo, há pelo menos dez anos já se sabia que haviam tardígrados no campus da universidade.
Os pesquisadores só não contavam que havia também uma espécie nova “debaixo do nosso nariz”, nas palavras de Emiliana. Também assinam o estudo o professor do IB André Garraffoni, e o pesquisador polonês Witold Morek, um dos principais tardigradologistas da atualidade.
Já faz vários anos que temos uma a disciplina de zoologia de invertebrados 2 que, no curso de ciências biológicas, é quando você estuda os tardígrados. Há anos é utilizado material coletado das árvores do IB para aulas práticas, mas a gente raspava os musgos e mostrava os animais de maneira geral, nunca ninguém tinha parado para identificar as espécies, comenta André.
André Garraffoni e Emiliana Brotto recolhem amostras de musgos onde ficam os tardígrados, na Unicamp
Antonio Scarpinetti / Unicamp
O que são tardígrados?
Tardígrados são animais microscópicos (cerca de 0,3 milímetros) que habitam ambientes aquáticos (rios, lagos, oceanos) e também ambientes úmidos terrestres, como os musgos das árvores do IB.
Mesmo sendo invisíveis a olho nu, Emiliana ressalta que eles são realmente animais. Portanto, são formados por inúmeras células e apresentam órgãos específicos, sistemas digestório, nervoso, excretor e reprodutor.
Com corpo segmentado e ser vertebras, os tardígrados possuem quatro pares de pernas - três primeiros voltados para frente e o último mais voltado para trás - com garras e/ou discos adesivos nas extremidades para locomoção.
Imagem microscópica de Milnesium iniquum
Laboratório de Microscopia Eletrônica do IB
Também possuem estruturas bucais muito características, e seu corpo é coberto por uma cutícula de quitina que é trocada periodicamente para permitir que o animal cresça – em um processo igual ao dos artrópodes.
Na classificação das espécies, o filo Tardigrada (do latim tardus = lento + gradus = passo) significa animais de passos lentos, o que condiz com o andar do bicho. Até o momento, a ciência conhece cerca de 1,4 mil espécies de tardígrados, sendo 80 brasileiros.
Diferenças nas garras
Segundo a bióloga, a maior dificuldade da pesquisa foi estabelecer os critérios para confirmar a descoberta. Para evitar que uma mesma espécie fosse apresentada como duas, ela analisou a variação nos corpos dos tardígrados em diferentes estágios da vida.
Ao todo, o processo de pesquisa levou cinco anos. Entre coletas de ovos e tardígrados adultos, análises microscópicas, consultas na literatura científica, comparações de DNA, contato com outros acadêmicos e outros tantos procedimentos, enfim as evidências.
Aparelhos usados para descrição da nova espécie de tardígrado
Emiliana Brotto Guidetti
Emiliana Guidetti percebeu que havia diferenças nas garras de indivíduos da espécie Milnesium iniquum em relação às outras.
“Eu vi que eles sempre tinham três ganchinhos, só que o terceiro gancho (que fica na base da garra) variava muito de tamanho, de uma pata para outra. E isso era uma coisa que a gente não via nas outras espécies”, afirma.
Essa diferença, que se mostrou fundamental na descrição do novo tardígrado, rendeu-lhe o nome de iniquum (do latim iniquus = desigual), em referência ao tamanho desigual das garras.
Criptobiose
Em meados dos anos 2000, esses animais alcançaram notoriedade mundial quando foram enviados ao espaço. Lá foi descoberta a capacidade deles de entrar em criptobiose, um estado de latência que permite ao animal sobreviver a uma série de situações extremas.
Criptobíose é um processo físico-químico que faz com que a estrutura proteica que vai formar várias partes da célula se modifique e ele entra em um estado de latência, no qual a parte fisiológica dele vai ficar 0,001% ativo. É como se ele desse um pause na vida dele, que pode levar anos, explica André.
Nova espécie pertence ao gênero Milnesium
Laboratório de Microscopia Eletrônica do IB
Nesse estado, os tardígrados conseguem resistir ao vácuo espacial e à radiação solar, bem como sobreviver à ausência de oxigênio e à irradiação ionizante, além de suportar temperaturas que variam do zero absoluto a 149 °C.
Ele é o único animal conhecido dentro de um grupo de mais de um milhão de espécies descritas que tem uma capacidade de diferenciar a estrutura corporal e suportar ambientes extremamente nocivos, completa o acadêmico.
‘Questões em aberto’
Para o professor André Garraffoni, orientador da mestranda, o maior desafio é conseguir identificar e descrever novas espécies de tardígrados enquanto o aquecimento global e o desmatamento ameaçam extinguir uma infinidade de organismos ainda desconhecidos.
A descoberta é importante, segundo ele, pelos seguintes pontos: por descrever um animal tão pouco conhecido (processo que necessita de aparelhagem ótica), por mostrar que mesmo em um ambiente muito antropizado é possível encontrar uma vasta fauna e por incentivar novos pesquisadores a descrever a biodiversidade brasileira, como Emiliana fez.
Hoje, no Brasi,l se conhece por volta de 80 espécies de tardígrados, mas a grande maioria foi descrita na década de 40 quando a gente teve a Rosina de Barros, uma brasileira que foi a primeira pessoa a trabalhar com esses grupos de animais que viviam nos musgos, principalmente do estado de São Paulo, explica o professor.
Musgo onde foram coletados os tardígrados da Unicamp
Emiliana Brotto Guidetti
Guidetti conta que quando estava começando uma iniciação científica durante a graduação, André sugeriu que ela analisasse mais a fundo a variedade de tardígrados que habitavam a Unicamp e, a partir daí, “um novo horizonte” se abriu para ela.
“Fiquei curiosa para descobrir esses animais, que são difíceis de trabalhar, mas têm potencial de apresentar algo novo por não ser uma área comum de se explorar”. Segundo ela, a literatura sobre tardígrados brasileiros é escassa e os poucos estudos disponíveis são antigos.
“Foi a primeira vez que conseguimos fazer, no Brasil, a análise do DNA de uma espécie daqui e usá-la para comparar com espécies de outros lugares do mundo”, comenta.
Futuramente, Emiliana deve prosseguir os estudos com tardígrados, pensando talvez em aplicações (medicina, bioindicadores, etc), mas ainda não sabe por onde começar. Para ela, esses pequenos seres deixam grandes questões em aberto.
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