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Caso Jamilly: CPI aponta fraudes em prontuário e sequência de erros no atendimento de criança morta após picada de escorpiã

G1 - com informações do G1

Rastro101
Com informações do G1

18/03/2024 por Redação

Relatório final, de 71 páginas, foi apresentado à imprensa na tarde desta segunda-feira (18) na Câmara de Piracicaba (SP); documento será encaminhado à Polícia Civil, MP, Coren, CRM e prefeitura. Jamily Vitória Duarte, de 5 anos, morreu após ser picada por escorpião em Piracicaba (SP)
Arquivo pessoal
Após cinco meses de trabalhos, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), que investigou o caso da menina Jamilly Vitória Duarte, de 5 anos, morta após ser picada por um escorpião em Piracicaba (SP), identificou a ocorrência de supostas tentativas de fraudes em registros e prontuário de atendimento à criança, bem como divergências e contradições em depoimentos. À Polícia Civil, a CPI recomenda realização de exame grafoténico. - 👇Leia mais detalhes, abaixo, na reportagem.
⚠️O documento de 71 páginas aponta, em trecho da conclusão, morte de Jamilly se deu após sequência de erros e irregularidades, entre eles:
falhas frequentes no sistema no dia do atendimento
inadequação da classificação do estado de saúde da paciente ao dar dar entrada na unidade de
saúde falta de conhecimento da equipe sobre fluxos de atendimento, medicamentos e procedimentos
falta de prescrição urgente de soro antiescorpiônico
ausência de acesso venoso periférico
divergências e supostas fraudes no preenchimento do prontuário
possíveis irregularidades no preenchimento do livro de registro de retirada do antidoto da geladeira de armazenamento
pontos contraditórios encontrados em alguns depoimentos
A denúncia, que integra relatório final da apuração, foi divulgada nesta segunda-feira (18) à imprensa e será encaminhado à Polícia Civil, ao Ministério Público, à Prefeitura Municipal de Piracicaba e a órgãos de classe, como o Conselho Regional de Enfermagem (Coren) e Conselho Regional de Medicina (CRM).
É evidente que a tragédia ocorrida não foi resultado de um único erro, mas sim de uma sequência de acontecimentos que comprometeram o atendimento de forma crítica, destaca trecho da conclusão da CPI.
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A menina recebeu os primeiros atendimentos na Unidade de Pronto Atendimento da Vila Cristina, gerenciada desde o mês de julho do ano passado pela Organização Social de Saúde (OSS) Mahatma Gandhi.
O documento aponta ainda inoperância ou falhas frequentes no sistema no dia do atendimento, fato que impactou diretamente na classificação inadequada da paciente.
Familiares de Jamilly falam à CPI da Câmara de Piracicaba
Guilherme Leite/Câmara de Piracicaba
Classificação errada
O relatório final da CPI, assinado pelo parlamentar Gustavo Pompeu, descreve que, no entendimento de entidades de classe e fiscalização que prestaram depoimento à comissão, a paciente poderia ter sido classificada com a cor vermelha. Mas foi erroneamente, identificada como cor laranja e que, em nenhum momento, fora feita uma nova análise do caso, diz trecho da conclusão.
A falta de conhecimento dos fluxos de atendimento, medicamentos e procedimentos por parte da equipe, incluindo a médica da UPA, que em um primeiro momento não prescreveu o soro antiescorpiônico, medicamento fundamental para conter a ação do veneno no corpo humano, resultou em encaminhamentos inadequados e na não aplicação da medicação que poderia ter melhorado a condição da paciente, observa relatório da CPI.
Acesso venoso
O ausência de acesso venoso periférico também foi um fator agravante, visto que a menina estava em condições que dificultaram e impediram o acesso para prosseguir com a medicação.
A comissão ressaltou, porém, que a equipe do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) também encontrou dificuldade na realização da punção. Não obstante, ambas equipes conseguiram realizar a punção, esse acesso teve pouca duração resultando na perda do acesso por diversos motivos, apontados ao longo deste relatório, destaca.
Soro antiescorpiônico
Dentre as divergências, a comissão identificou que o soro antiescorpiônico não teria sido prescrito pela médica até o momento da transferência da criança pelo Samu. Mas, a prescrição aparece posteriormente no prontuário que permaneceu na UPA.
No prontuário entregue à CPI pela OSS, consta a prescrição do soro antiescorpiônico. Já no prontuário que seguiu com Jamilly para a Santa Casa, fornecido pelo hospital, não há a prescrição do soro. Conforme os depoimentos colhidos pela CPI, o prontuário teria sido adulterado após a transferência de Jamilly.
A médica responsável pelo atendimento informou, em depoimento à CPI, que não sabia da existência do soro na unidade e que fez a prescrição após obter a informação. Membros da equipe relataram, também em depoimentos, que a médica teria informado que não sabia a dosagem a ser aplicada na criança.
“Essa possível fraude nos documentos é como matar a Jamilly duas vezes”, avaliou o relator, Gustavo Pompeo. “É uma violência quando não fazem o tratamento adequado e depois ainda possivelmente se faz essa adulteração de documentos”.
Diligência
Em diligência à UPA em 26 de setembro de 2023, os membros da CPI coletaram o livro de registro de retirada de medicamentos da câmara fria. E lá constava a retirada de quatro ampolas de soro antiescorpiônico destinadas à paciente Jamilly.
No entanto, a paciente não recebeu o antídoto. Já o enfermeiro que aparece como responsável pela baixa do medicamento manifestou à CPI que a assinatura que constava no livro não havia sido feita por ele, aponta o Legislativo.
Jamilly Vitória Duarte, de 5 anos, morreu após ser picada por escorpião em Piracicaba (SP)
Arquivo pessoal
CPI em números
A CPI foi formada na Câmara, em 24 de agosto de 2023, no mês da morte de Jamilly. A comissão foi composta pelos vereadores Acácio Godoy (PP), presidente; Gustavo Pompeo (Avante), relator; e pelos membros Cássio Luiz Barbosa (PL), o Cássio Fala Pira, Pedro Kawai (PSDB) e Paulo Camolesi (PDT).
Os trabalhos de investigação começaram no dia 1º de setembro de 2023. O relatório final foi protocolado na Câmara no dia 15 de março de 2024. O processo todo totaliza 570 páginas. A CPI realizou:
34 oitivas (convocações e reconvocações) com funcionários que participaram do atendimento na UPA, pelo Samu, e Santa Casa; representantes de entidades de classe; gestores e ex-gestores da OSS Mahatma Ghandi, gestores da Santa Casa, representantes da Vigilância Epidemiológica do Estado, Vigilância em Saúde do município e familiares da paciente
37 horas de gravação
19 Requerimentos e ofícios enviados
2 Acareações: 2 funcionários da UPA
1 diligência
20 reuniões
Foram analisados documentos como
Relatórios de atendimento enviados pela equipe da Unidade de Pronto Atendimento – UPA “Frei Sigrist”- Vila Cristina
Relatório enviado pela equipe do Samu
Relatório enviado pela Santa Casa
Contrato entre Prefeitura Municipal de Piracicaba e OSS Mahatma Gandhi
Relatório de fiscalização do contrato
Cópia do processo de sindicância interna da Prefeitura
Relatório da investigação interna da OSS
Protocolos de atendimento
Informações sobre os treinamentos prestados relacionados aos acidentes com escorpião
Respostas a demais requerimentos
Prédio da UPA Vila Cristina, em Piracicaba
Isabela Borghese/ Prefeitura de Piracicaba
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Exame grafotécnico
A CPI recomenda que seja realizado exame grafotécnico pela Polícia Civil a fim de averiguar a possível falsificação de assinatura no livro de registros de retirada de medicamentos da unidade.
A CPI também solicita à Polícia a análise de imagens, já que, segundo a médica, alguém teria informado que não havia soro na unidade. O objetivo é saber se esse diálogo aconteceu no momento descrito pela profissional.
Criança morre após ser picada por escorpião em Piracicaba
Prefeitura e OSS
Em novembro de 2023, quando consultada pelo g1, a OSS que administra a unidade informou o acesso na veia da paciente foi feito após avaliação com a médica, mas esse acesso foi perdido e foram feitas novas tentativas de restabelecê-lo, que não tiveram sucesso devido à desidratação da criança.
Na época, a organização social admitiu que foi constatada a existência do soro na unidade após a perda do acesso na veia de Jamilly, quando o Samu já estava no local para realizar a transferência.
“Diante deste contexto, foi em comum consentimento entre as equipes em realizar a transferência imediata da paciente para Unidade de Terapia Intensiva da Santa Casa de Piracicaba, por associar a recursos de alta complexidade e possibilidade de administrar o soro antiescorpiônico”, acrescentou.
A OSS garantiu que “é de conhecimento da equipe que a UPA Vila Cristina é referência para casos de escorpionismo, cabendo ressaltar que a coordenação da unidade havia participado de orientações sobre fluxos de soro”. Também garantiu que os profissionais são treinados para este tipo de atendimento.
“Destacamos, por fim, que é preciso atentar-se que o tempo de atendimento na UPA, considerando a entrada e saída da unidade, foi pouco mais de uma hora, tempo muito menor que interstício da picada e socorro pela família e a permanência na Santa Casa”, finalizou.
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