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Em caso raro de gêmeos siameses unidos pelo cérebro, família de Sorocaba luta para ter acesso a tratamento

G1 - com informações do G1

Rastro101
Com informações do G1

22/02/2024 por Redação

Cirurgia de separação foi feita após 52 dias do nascimento, mas um dos irmãos não resistiu. Augusto sobreviveu à cirurgia e agora a família luta para ter acesso ao tratamento gratuito
Reprodução/TV TEM
Uma família de Sorocaba (SP) entrou na Justiça em busca de tratamento para o filho. Após dar à luz gêmeos siameses unidos pelo cérebro, uma cirurgia de separação foi feita, mas um dos bebês não resistiu. Agora, a luta dos pais é para que a prefeitura e o estado banquem os cuidados do sobrevivente Augusto.
A condição dos gêmeos siameses era considerada rara. Nos últimos 11 anos, foram pouco mais de 500 nascimentos de siameses no Brasil. No caso de gêmeos unidos pela cabeça são ainda mais raros, sendo um caso registrado a cada 2,5 milhões de nascimentos.
O irmão de Augusto, Heitor, tinha problemas no coração. A batalha pela vida dos irmãos teve início com um procedimento que precisava ser feito com rapidez e em uma cirurgia.
Com apenas 52 dias de vida, o procedimento para separá-los foi feito por meio do Sistema Único de Saúde (SUS) no Instituto Estadual do Cérebro Paulo Niemeyer, no Rio de Janeiro, referência em casos do tipo. Após mais de dez horas no centro cirúrgico, os pais dos irmãos, Victor e Ludmylla Araujo, receberam a notícia de que Heitor não havia resistido. Segundo a equipe médica, ele foi essencial para salvar a vida do irmão.
Segundo o médico responsável pelo procedimento, Gabriel Mufarrej, a intenção da equipe era salvar a vida dos dois.
“Como a gente viu que o Heitor faleceu naquele momento, a gente entrou um pouquinho no cérebro do Heitor, preservando o cérebro do Augusto [...] Ficou um pouquinho de cérebro do Heitor no cérebro do Augusto”, iniciou.
“Como a gente não podia contar mais com o Heitor, mas os tecidos dele ainda estavam viáveis, nós aproveitamos toda a meninge, que é como se fosse uma fronha que recobre o cérebro. Imagine o cérebro sendo um travesseiro e a meninge sendo a fronha. Essa fronha recobre o cérebro. Então, pegamos essa meninge do Heitor e ‘recobrimos’ todo o cérebro do Augusto [...], assim como o osso do Heitor, que serviu para cobrir a falha óssea que existia na abóbada craniana do Augusto, e a pele também”, completou.
Cirurgia de separação foi feita após 52 dias do nascimento dos gêmeos, mas um deles não resistiu
Reprodução/TV TEM
Embora a cirurgia tenha sido feita em um lugar referência em casos do tipo, o caminho até lá não foi fácil. Em Sorocaba, Ludmylla foi atendida na Policlínica, onde recebeu o primeiro diagnóstico de gêmeos siameses. Ela e Victor iniciaram as pesquisas em busca de especialistas, quando chegaram ao médico que fez o procedimento.
Enquanto os primeiros contatos eram feitos, o casal passou por uma consulta em São Paulo. Com dez semanas de gestação, ouviram a recomendação de que a gravidez deveria ser interrompida.
No entanto, segundo Victor, o exame não possuía uma qualidade de imagem boa e, assim que o finalizaram, foram conversar com um médico.
“Ele falou: ‘bom, nós constatamos que seus filhos são gêmeos siameses craniópagos, mas, infelizmente, eles compartilham um cérebro e meio, e este tipo de condição não é compatível com a vida. A gente vai fazer uma carta de interrupção e não tem tratamento pré-uterino, nem pós-natal para essa classificação”, relembra.
Falta de apoio
Após receberem a recomendação de interromperem a gestação, os pais preferiram ouvir outra opinião. Como já tinham entrado em contato com o médico do Rio de Janeiro, decidiram seguir o tratamento com ele.
Augusto precisa usar um capacete para corrigir o formato do crânio
Reprodução/TV TEM
A equipe médica chefiada por Gabriel Mufarrej garantiu que a gestação poderia continuar. No entanto, o casal se deparou com um segundo problema: uma mudança para o Rio de Janeiro era necessária. Como não possuíam recursos, Ludmylla e Victor pediram ajuda para a Prefeitura de Sorocaba.
O casal deu entrada com pedidos para receber os benefícios dados a quem tem algum tipo de alteração na gestação. Os pais conseguiram uma liminar na Justiça para que a prefeitura disponibilizasse transporte aéreo ou terrestre.
No entanto, segundo Victor, quando a gravidez de Ludmylla chegou a 30 semanas, data limite para ir ao Rio de Janeiro, a prefeitura forneceu uma passagem de ônibus com mais de dez horas de viagem.
“[Mesmo com] A Ludmylla tendo uma gestação de altíssimo risco, já com algumas prevenções para não dilatar mais o colo do útero. Não aceitamos esse benefício da prefeitura e achamos mais prudente ir por conta própria com o nosso carro. Aí a gente poderia parar na estrada quantas vezes fosse necessário ou até se acontecesse alguma emergência”, explica.
Para viajar ao Rio de Janeiro, o casal largou o emprego e vendeu o que podia. O parto foi feito com 32 semanas de gestação e os irmãos precisaram ir para a Unidade de Terapia Intensiva (UTI).
Ações na Justiça
Família entrou com uma ação na Justiça contra a prefeitura de Sorocaba e o estado de São Paulo
Reprodução/TV TEM
O casal retornou para Sorocaba (SP) após o procedimento, mas diz que ainda há um longo caminho a ser percorrido, já que o tratamento é especializado e caro. O pequeno Augusto precisa usar um capacete para corrigir o formato do crânio.
O que ele utiliza atualmente é temporário, mas o novo aparelho custa quase R$ 20 mil. Além disso, ele também faz três sessões de fisioterapia por semana, com um custo de R$ 300 cada. Segundo o casal, foi preciso dar entrada por meios particulares, pois não recebeu recurso da prefeitura de Sorocaba.
“Infelizmente a gente não pode arcar [com os gastos]. Tanto que, infelizmente, a gente teve que recorrer a recursos próprios, doações, amigos, colegas que se sensibilizaram com a história dele enos ajudaram, de certa forma, possamos pagar”, lamenta Ludmylla.
A família também recebeu a ajuda do neurocirurgião inglês Owase Jeelani, que também participou da cirurgia dos irmãos. O médico se colocou à disposição da família para acompanhar Augusto de forma gratuita na Inglaterra. Para isso, a família precisa pagar pela viagem e hospedagem.
O casal entrou na Justiça para que a prefeitura e o estado de São Paulo paguem as despesas com o tratamento fora do domicílio, custos com refeição, transporte e moradia no Rio de Janeiro.
A primeira decisão foi favorável, mas acabou revertida com recurso apresentado pela prefeitura. Segundo o advogado da família, Fernando Domingues Ferreira, Augusto é protegido pelo Estatuto da Criança e do Adolecente (ECA).
“O ECA é bem claro. A criança tem que ter o desenvolvimento normal, tem o direito à vida, a crescer. A gente tem que exercer esses direitos. Então, nós precisamos da intervenção estadual, que ela assuma seu papel como gestora e dê todo esse aporte à eles”, explica.
Em nota, a prefeitura de Sorocaba se colocou à disposição e disse que conversa com a família sobre como ajudá-la. Também informou que a família, depois de ser atendida na cidade, optou pelo tratamento no Rio de Janeiro.
A Secretaria do Estado da Saúde informou que Ludmylla foi atendida no Hospital das Clínicas, em São Paulo, mas escolhei ir para o Rio de Janeiro, onde foi feito o parto dos gêmeos. No entanto, a secretaria não comentou sobre o processo na Justiça para custear o tratamento.
A TV TEM também questionou o Ministério da Saúde sobre como poderia ajudar, mas não teve retorno até a última atualização desta reportagem.
Enquanto não há uma decisão, a família continua a batalha diária e particular. Segundo Ludmylla, a luta para conseguir os direitos para o filho não terminará até que consigam o suporte necessário.
Família afirma que não deixará de lutar pelos direitos do filho
Reprodução/TV TEM
“A gente vai até o final, porque é uma questão que está dentro dos direitos e deveres do estado e da cidade de Sorocaba. Então, a gente só quer que a gente tenha esse apoio e que possa trazer a qualidade de vida que ele merece”, afirma Ludmylla.
A luta de Ludmylla, Victor e Augusto emociona até mesmo quem está acostumado a grandes procedimentos e que participou de perto da luta dos irmãos.
“O Heitor partiu e hoje ele vive no irmão. O Heitor continua vivo no Augusto, o Augusto está evoluindo muito bem, graças a esse herói que se chama Heitor”, finaliza o médico Gabriel Mufarrej, emocionado.
Os interessados em ajudar a família com arrecadações para o tratamento de Augusto podem entrar em contato com Ludmylla e Victor pelas redes sociais do pequeno.
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