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Entenda o que está em jogo na viagem de Bolsonaro à Rússia e Hungria

Em meio à crise entre Rússia e Ucrânia, e às vésperas das eleições na Hungria, analistas avaliam riscos e recados da tour de Bolsonaro pelo Leste Europeu

Rastro101
Com informações do site O Tempo

13/02/2022 por Redação

Divulgação/O TempoDivulgação/O TempoA visita do presidente da República Jair Bolsonaro (PL) aos presidentes russo e húngaro – Vladimir Putin e Viktor Orbán respectivamente – tem sido interpretada como arriscada na atual conjuntura do Leste Europeu.

O chefe do Executivo federal viajará com comitiva para Moscou, capital russa, na próxima segunda-feira (14). Devem desembarcar no país no dia seguinte e vão participar de encontro com Putin e empresários no dia 16. No dia 17, a comitiva presidencial vai se dirigir a Budapeste, capital húngara, onde deve ficar até o dia 19 de fevereiro.

Negociada em novembro do ano passado pelo ministro das Relações Exteriores, Carlos França, a viagem de Bolsonaro à Rússia pode ter consequências negativas para a diplomacia brasileira, tendo em vista um conflito bélico iminente entre russos e ucranianos.

O encontro com Orbán não é menos problemático para as relações exteriores brasileiras. Líder conservador de extrema-direita, o presidente húngaro vai disputar pela quarta vez consecutiva as eleições do país, marcadas para o início de abril.

Pela primeira vez, o cenário se mostra mais difícil, com uma oposição mais unida contra ele, o que aumenta as chances de derrota. Se Orbán for derrotado, novamente o presidente brasileiro se verá com menos um país aliado no continente europeu.

Embora o Ministério das Relações Exteriores não tenha respondido aos questionamentos da reportagem sobre quais são os objetivos da missão, especialistas em relações exteriores consultados para O TEMPO avaliam que Bolsonaro vai focar nas relações comerciais e acordos bilaterais com esses países, sem mencionar assuntos mais polêmicos.

A iniciativa também revela a busca do presidente de mostrar para sua base de apoio, em ano eleitoral, que não está isolado no cenário internacional.

“A Hungria está nesse pacote porque a base de apoio ao presidente é conservadora, e o Orbán é um dos principais proponentes do conservadorismo internacional, tendo em vista o debate sobre aborto, união homoafetiva, entre outros”, nota Leonardo Paz Neves, pesquisador do Núcleo de Prospecção e Inteligência Internacional (NPII) da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro (FGV-RJ) e professor de Relações Internacionais da Faculdade Ibmec. 

A visita à Rússia e à Hungria se encaixa na filosofia política do presidente, para ter repercussão no público de apoiadores dele. Bolsonaro disse publicamente que iria visitar esses países porque vê Putin e Orbán como conservadores, complementa o diplomata Rubens Barbosa, que foi embaixador do Brasil em Londres (Inglaterra) e em Washington (Estados Unidos).

Por outro lado, a iniciativa do mandatário brasileiro de manter a visita a Putin e Orbán não tende a aumentar as chances de melhorar sua imagem para dirigentes do Ocidente.

Bolsonaro tem sido considerado um ator político relativamente tóxico no ambiente internacional. Boa parte dos líderes mundiais não quer aparecer ao lado dele, não o convida para visitas, por isso se considera que ele está isolado”, observa Neves.

Implicações do conflito entre Rússia e Ucrânia

Desde que Putin mobilizou milhares de tropas para a fronteira com a Ucrânia, criou-se um cenário de tensão com os países membros da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), liderados pelos Estados Unidos. Isso porque o líder russo tem acusado a organização de tentar ampliar sua influência no Leste Europeu. Por temer que a Ucrânia integre a organização, Putin decidiu intimidar o país vizinho.

Para o diplomata Paulo Roberto Almeida, que foi embaixador do Brasil em Paris (França) e Washington, a viagem de Bolsonaro à Rússia não será interpretada somente como um encontro para acordos bilaterais, diante do atual contexto de conflito na região.

“É uma viagem inoportuna e indesejável, não apenas porque os Estados Unidos se manifestaram contrariamente à manutenção dessa viagem do Bolsonaro. A diplomacia brasileira sempre foi adepta do absoluto respeito ao direito internacional, por isso essa viagem é condenável, ressaltou o diplomata.

O que a Rússia está fazendo com a Ucrânia vai contra o direito internacional. É uma intimidação para forçar um país soberano a ter política interna e externa que atenda aos interesses russos, acrescentou.

Com perspectiva semelhante, Neves lembra que Washington tem se posicionado criticamente contra essa viagem, “pressionando para que o Brasil condene as ações dos russos na Ucrânia”.

“O Brasil se coloca numa situação delicada, porque o país é considerado um aliado extra OTAN, sobretudo como um aliado dos Estados Unidos. Essa viagem à Rússia não está alinhada com essa postura”, reforça o especialista.

Viagem à Rússia é importante para o agro brasileiro

Em discordância com essas avaliações, Barbosa nota que o presidente brasileiro agiu corretamente ao decidir manter a visita a Putin.

O presidente não podia desmarcar uma viagem que estava marcada desde novembro do ano passado, pois seria compreendido como pressão dos EUA. Ele resolveu correr o risco de durante a visita haver alguma ação militar russa ou algo que ele diga seja interpretado como apoio à Rússia, como fez o presidente da Argentina, Alberto Fernández, considerou o diplomata, que também é presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (IRICE).

Para ele, o Brasil já deixou claro que vai manter um posicionamento neutro e não tomará partido sobre o conflito. A visita do presidente brasileiro é bilateral, ao contrário da visita do [presidente da França] Macron, que foi discutir sobre a Ucrânia. O Brasil e Argentina foram à Rússia para discutir interesses bilaterais, observou.

Ainda de acordo com a perspectiva de Barbosa, o interesse brasileiro nas negociações com a Rússia perpassa questões governamentais.

Do ponto de vista do setor privado brasileiro, há um interesse concreto nessas conversas [com a Rússia] porque haverá também reunião empresarial. Uma grande parte dos fertilizantes para a indústria do agro brasileira vem da Rússia e da Bielorrússia”, avalia o diplomata.

“É importante essa reunião empresarial para assegurar a continuidade do uso de fertilizantes, os defensivos, que são importados sobretudo desses países, para nós é um setor estratégico, conclui.

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